14 dezembro, 2008

A vida como ela é


Colegas queridas

As férias se aproximam e teremos nossos momentos de merecidos descanso e descontração, livres de horários rígidos e do corre corre, que fazem parte do cotidiano de todos nós.
Portanto, como sugestão de uma boa leitura, Gabriel Chalita nos dá uma opção, que certamente
muito contribuirá para nosso enriquecimento, até porque, o texto de apresentação que se segue, já é em si, muito bom !!
Bom domingo, Ana Celina





A VIDA COMO ELA É


Por Gabriel Chalita


Não celebramos os clássicos por acaso. Eles nos ensinam métodos de composição literária, refletem um momento dentro do tempo, mostram a cultura, costumes, movimentos sociais, estética dominante. Foi assim com o Romantismo, por exemplo, uma das mais fortes e produtivas correntes literárias. E foi assim também com o Realismo, que veio em seguida para trazer a obra literária para mais perto da realidade. Exagerou na crueza das situações e na nudez das descrições.
Mas, em literatura, como na vida, parece certo que o meio-termo é que é o termo certo. E surgiu, nos dias de hoje, uma nova maneira de contar histórias, mesclando o descritivo e o analítico com o subjetivo e o emocional. É uma literatura mais cotidiana, mais “a vida como ela é”, como queria Nelson Rodrigues. A vida não é novela, mas um mestre da televisão pode tornar uma novela tão expressiva quanto a própria vida. Esse mestre é Walcyr Carrasco, que nos dá a surpresa de trazer à luz o livro A palavra não dita. A obra de Walcyr é uma história sincera. Com toda a honestidade, o autor faz com que os personagens interajam, e não lhes esconde os sentimentos. Essa franqueza perpassa o relato inteiro, e as pessoas retratadas revelam suas almas, com as purezas, mesquinharias, temores e anseios que habitam todas as almas. Gente sem os disfarces românticos ou os exageros realistas. São pessoas, encontrando-se e desencontrando-se. E, por isso mesmo, é a boa literatura, moderna e forte. Moderna porque trata, do ponto de vista do conteúdo, de temas atuais, observados pelo olhar do jornalista que se acostumou a observar a vida social, a participar e até a alterar o seu rumo. Do ponto de vista da linguagem, simples e direta, com traços de coloquialidade que trazem à tona os aspectos tribais presentes nos diferentes grupamentos. A naturalidade com que o paulista Walcyr Carrasco trata do linguajar do povo gaúcho, em especial dos jovens de Porto Alegre, revela uma boa pesquisa e um excelente espírito de observação. Forte porque aborda corajosamente um tema relegado ao noticiário do chamado “mundo cão”, e o faz com naturalidade, respeito, e principalmente honestidade. Lá dentro, na trama narrativa, Walcyr Carrasco vai usando alguns artifícios. Um deles é o de explicar, como se fosse casualmente, termos, vocábulos e situações, com um propósito didático, mas que não soa como aula. E vai buscar apoio na própria linguagem dos jovens, para que tudo seja explicado para o jovem leitor na sua própria forma de comunicação. Coisa de escritor sensível ao mundo que o rodeia. Mas é o conjunto de valores expressos na narrativa o que dá ao livro o peso pedagógico e que lhe dá motivo para ser comentado neste espaço. A história de Walcyr Carrasco fala de sinceridade. De honestidade. De lealdade. As más ações contadas no livro não resultam em geral de má índole dos personagens, mas de contingências e circunstâncias. Porque o mundo é assim mesmo. As pessoas não fazem o mal, normalmente, para prejudicar, mas porque escolheram motivos e atitudes erradas diante da vida. O livro fala também que não se deve julgar as pessoas com base em idéias pré-concebidas. Cibele, a personagem principal, narradora, vai aprender isso a todo momento.Por essas razões é que venho recomendar aos professores que trabalhem em sala o livro A palavra não dita, de Walcyr Carrasco. Evidentemente os educadores terão que destacar e corrigir dois ou três erros de revisão – coisa rara numa editora séria como a Moderna, mas que não comprometem a qualidade geral do livro. É claro também que os professores não deverão abandonar os clássicos, mas uma leitura como esta, complementarmente, ajuda a entender o mundo. O mundo como ele é.

Gabriel Chalita é doutor em Direito e em Comunicação e Semiótica, professor da PUCSP e Mackenzie. É ex-secretário estadual de Educação de São Paulo e ex-presidente do Consed (Conselho Nacional dos Secretários de Educação). É membro da Academia Paulista de Letras. Atualmente preside o Instituto Educativa, dedicado a treinamento em empresas nas áreas de educação, ética e gestão de pessoas (http://www.educativapalestras.com.br/)

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